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Boa Gestão das Obras não basta

Em nossa prática de consultoria é muito comum ouvirmos de construtores o tradicional discurso de boa gestão de obras. E não duvidamos que haja realmente muitos bons construtores no mercado, assim como temos consciência de que há também uma quantidade significativa daqueles que só tem discurso, mas que mal gerenciam o próprio tempo. O que temos percebido é que nem todos os profissionais estão conscientes da diferença entre gerenciar uma obra e gerenciar um empreendimento. Pode parecer um detalhe, mas para o empreendedor, proprietário da obra, isso faz absolutamente toda a diferença.


O problema se repete se pensarmos nos profissionais de projeto (de Arquitetura e Engenharia). Há os que projetam edifícios pensando na obra e há os que projetam edifícios para os negócios de seus clientes. Parece ser a mesma coisa, mas são alvos bem diferentes e muito fáceis de confundir quando não se conhece um deles. É claro que há vários edifícios capazes de atender o cliente, mas o dever de competência dos profissionais impõe que se escolha o melhor para o empreendimento, o que concilia requisitos técnicos com requisitos de negócio. O cliente não paga profissionais para ter uma solução qualquer, mas para ter uma otimizada. A menos que pague pouco, claro! Neste caso, terá o resultado proporcional.


Vou chamar de mercado imobiliário leigo aquela parcela do mercado em que o empreendedor, que não é profissional nesta área, mas ganhou dinheiro noutro setor, resolve conduzir seu empreendimento. Normalmente contrata um projeto de arquitetura e um construtor, aprova o projeto na prefeitura e começa a obra, que planeja fazer com recursos próprios. Muitas das vezes não têm sequer uma boa precisão do valor do investimento que será feito, quanto mais ter algum número que indique o retorno que terá (afinal é um investimento). Isso acontece em cada esquina do nosso país. O resultado também pode ser visto em cada esquina: obras inacabadas ou paralisadas, receitas que mal compensam os custos e até prejuízos.


Talvez seja até sorte para estes empreendedores que eles não saibam avaliar o prejuízo que amarguram no que se refere ao investimento. Assim, dormem tranquilos, girando dinheiro na praça e achando que esse giro significa riqueza. Lembro de um professor com quem aprendi que segurança e ilusão de segurança são coisas bem diferentes. Retorno financeiro e ilusão de retorno financeiro segue a mesma ideia.


Dito isto, podemos concentrar na diferenciação entre Gestão de Obras e Gestão de Empreendimentos. Precisamos começar, claro, conceituando ambos.


Obras referem-se aos trabalhos de execução do produto imobiliário. Trata-se de concretizar o que foi projetado e envolve a mobilização e aplicação de recursos diversos nisso. Esses trabalhos e recursos precisam ser gerenciados, obviamente. A Gestão de Obras, de forma objetiva, cuida de administrar o processo de execução para que o produto (o edifício) seja gerado conforme os requisitos planejados, normalmente expressos no Projeto de Arquitetura e Engenharia e no Planejamento de Obra. Uma boa gestão de obras é, em essência, aquela que concretiza o produto com a qualidade requerida, mantendo-se fiel ao orçamento e prazos planejados.


Um empreendimento, por outro lado, é uma organização, permanente ou temporária, constituída para operar um negócio. O empreendedor é aquele que assume a responsabilidade de operar este negócio. Como negócio, o capital investido deve ser recuperado agregado de alguma compensação pelo risco corrido. A boa gestão do empreendimento é aquela que realiza o retorno planejado. Já a boa gestão do negócio é aquela que planeja e realiza um retorno melhor que as demais alternativas. No mercado imobiliário, a boa gestão do empreendimento garante o retorno planejado e a boa gestão do negócio garante que se invista em empreendimentos com melhores retornos.



Repare que, com base na percepção comentada no início, é possível (e há muito empreendedor nessa situação) fazer obras que não são bons empreendimentos e nem bons negócios. As unidades imobiliárias resultantes podem ser vendidas ou locadas, gerando receita e dando a ilusão de sucesso. Como empreendimento, será sucesso de der o retorno previsto e como negócios, será sucesso se der retorno maior que alternativas.


Há muitos empreendedores no mercado imobiliário leigo assessorados por projetistas e construtores que têm boa visão da Gestão de Obras (nem vou comentar os casos em que nem nisso a visão é boa). Percebo também, nesta fatia significativa do mercado, que é bem mais difícil achar Gestores de Empreendimentos e Gestores de Negócios assessorando empreendedores.


A razão me parece um tanto óbvia: Gestores de Empreendimentos e Gestores de Negócios são profissionais mais caros. Por isso, empreendedores leigos são facilmente ludibriados pelo discurso da boa Gestão de Obras, como se obra boa salvasse o retorno do investimento feito. Obra boa não é sinônimo de comercialização boa. É preciso oferecer ao mercado o que ele quer, isso deveria ser simples para qualquer empreendedor entender. As pesquisas mostram , por exemplo, que a localização do imóvel pesa bem mais na decisão (de compra ou locação) que o próprio imóvel (que aliás, o comprador/locador avalia de forma leiga).


Se você for ao banco verá que os melhores retornos são reservados aos investimentos que exigem maior valor investido. A analogia é simples, se um empreendedor quer garantir retorno, precisa investir em uma boa gestão do empreendimento e do negócio. Caso contrário, estará diante de um clássico caso do “barato que sai caro”. Mas, veja só, nem é preciso ser empreendedor para saber disso, é sabedoria popular.


Fica então a pergunta: por que empreendedores do mercado imobiliário leigo insistem em não investir em Gestão de Empreendimentos e acham que a Gestão de Obras vai garantir o negócio? Arrisco o palpite de que isso é apenas uma questão cultural e ignorância da complexidade dos negócios imobiliários, associada à ilusão de retorno. Demonstra apenas que o risco de empreender não está apenas nas oscilações do mercado. Empreendedores se arriscam na corda bamba e colocam a culpa do insucesso no governo, esquecendo que a primeira governança com que devem lidar é a governança dos negócios.

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